segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Notícias - Julia Lipnitskaya diz adeus

Parece que a jovem patinadora russa Julia Lipnitskaya decidiu dizer adeus à patinagem de competição. No dia 28 de Agosto de 2017 surgiu uma catadupa de artigos na imprensa russa dando conta que Julia teve de se submeter a um período de tratamento devido a anorexia e que agora já está melhor de saúde. No entanto, ela não planeia regressar à patinagem de competição.
Julia ganhou uma imensa legião de fãs ainda no escalão júnior e maravilhou o mundo com o programa livre patinado ao som da banda sonora "A Lista de Schindler". Na temporada 2013/2014, Julia tornou-se campeã olímpica por equipas em Sochi, campeã da Europa e vice-campeã do mundo. Na sua curta carreira, Julia tocou o coração de muita gente e dificilmente será esquecida.





quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Tradução de entrevista da treinadora Elena Buyanova

Elena Vodorezova Buyanova é uma lenda viva da patinagem artística russa. Nos seus tempos de atleta, Elena patinou na categoria de individuais femininos em representação da União Soviética. Talento precoce, Elena participou nos Jogos Olímpicos de Inverno em 1976, com apenas 12 anos de idade. Uma doença brutal obrigou-a a terminar a carreira competitiva. No entanto, ela nunca se afastou completamente da patinagem artística e construiu uma carreira de respeito como treinadora. O seu maior feito terá sido o de levar Adelina Sotnikova ao título olímpico em 2014. A relação com Adelina azedou depois disso e nesta entrevista ela fala bastante sobre a sua antiga pupila que agora está integrada na Academia de Evgeny Plushenko. Actualmente, Elena Buyanova é a treinadora responsável por Elena Radionova e Maria Sotskova.

O link original pode ser consultado aqui: http://www.sport-express.ru/se-velena/reviews/elena-buyanova-nam-s-sotnikovoy-nuzhno-bylo-perestat-sebya-obmanyvat-1297646/

Aviso: as marcações em itálico são notas feitas por mim para ajudar a contextualizar algumas coisas. 


Tradução de entrevista


A entrevistadora não perdeu tempo e começou logo por tocar na ferida: a quebra de confiança entre Adelina Sotnikova e Elena Buyanova.

Pergunta: Quando um atleta toma a decisão de mudar de treinador, há sempre um momento anterior em que a relação que existia esfria, um afastamento. A mudança da tua pupila para o Evgeny Plushenko foi algo inesperado para ti ou no fundo já sabias que isso acabaria por acontecer?

Elena Buyanova – Tudo acontece por uma razão. Eu penso que o primeiro momento em que fui atingida, como treinadora, foi a lesão da Adelina em 2015. Anteriormente, ela nunca tinha sido afectada por lesões graves. Nunca. A Sotnikova foi sempre não apenas muito disciplinada e trabalhadora como também estava em boa forma – não tinha um único ponto fraco no seu corpo. Os problemas começaram depois de uma pausa nos treinos. A Adelina começou a ser convidada para vários eventos; eu não me importei mas sempre disse: tu é que tens de decidir o que é que queres. Ela sempre respondeu que queria patinar. Enquanto treinadora, eu vi claramente o que queria fazer, e como, com a Adelina no futuro. Mas um ano mais tarde eu percebi que existiam certas coisas que não me estavam exactamente a aborrecer mas…

Pergunta: Querias mais clareza?

Elena Buyanova – Isso em primeiro lugar. Tu sabes que tipo de regime é que um atleta tem de cumprir para permanecer competitivo. Nós, por outro lado, tínhamos uma espécie de caos. Nós decidimos em conjunto que precisávamos de competir pelo menos nas competições de categoria B e nós criámos grandes programas. Claro que foi difícil para a Adelina. Ela ganhou peso. Não muito mas o suficiente para lhe causar dores nas costas quando ela treinava. Mesmo assim, ela trabalhou arduamente e queria competir. O assunto “Ice Age” não estava fora de questão. Eu sei que a Sotnikova estava sempre a ser convidada para participar e ofereceram-lhe muito dinheiro. Mais do que isso, nós discutimos esse assunto e eu pensei que a decisão estava tomada. Lembraste de quando eu e tu falámos sobre quão difícil é para um atleta campeão olímpico arranjar uma nova motivação para continuar? Na altura eu estava sempre a pensar nisso. Eu estava tão feliz quando nós apresentámos os planos para a nova temporada depois da semana de testes em Setembro: não fui eu mas sim a Adelina que deu voz à sua vontade de patinar e de competir. Então nós apresentámos os planos e literalmente poucos dias depois, quando regressámos a Moscovo vindas de Sochi, a Adelina disse que ia participar no “Ice Age”. Para mim isso foi… o ponto final, acho eu. Tu sabes que há um limite na confiança porque… bem, tem os seus limites.

“Ice Age” é um programa super popular na Rússia e é transmitido no canal estatal. Nesse programa, patinadores famosos formam parceria com personalidades artísticas de primeira linha e têm de patinar diversos temas em conjunto. As audiências são enormes e depois também existem digressões pelo país, normalmente sempre com lotação esgotada.


Vídeo de uma das actuações de Adelina Sotnikova no programa "Ice Age" com um famoso actor russo.




Adelina Sotnikova


Pergunta: Tu já pensaste que também podes ter culpa? Talvez não tenhas estado junto da tua pupila no momento em que ela precisou de ti, não disseste as palavras certas, se calhar não foste suficientemente dura?

Elena Buyanova – Eu pensei. Provavelmente devia tê-la pressionado mais e ter sido mais dura. No entanto, eu permiti que a atleta fizesse o que fez e claro que é culpa minha. Mas eu não podia ter feito diferente – eu vi como a Adelina estava a amar tudo aquilo. Durante muitos anos ela não pôde viver uma vida normal ou fazer o que queria. Ela é uma boa menina, muito amável e compassiva. Como um dos nossos treinadores disse uma vez: podias aplicar a Sotnikova nas feridas e elas curavam-se. Para que saibas o que é que acontece: estabeleces um objectivo, alcanças o objectivo e depois soltas-te um pouco. Parece fácil: basta dar um passo atrás e regressas à tua vida antiga. Só que isso não é verdade.


Pergunta: No início da nossa conversa tu disseste que sabias para onde orientar a Adelina. Quais eram os teus planos?

Elena Buyanova – A Adelina tem um potencial técnico muito elevado. Ela podia realizar um toeloop quádruplo mas o seu corpo tinha de estar preparado.

Pergunta: Porquê um toeloop quádruplo e não um triplo axel?

Elena Buyanova – Nós tentámos o triplo axel antes dos Jogos Olímpicos. A rotação da Adelina não era má mas o seu toeloop era melhor. Então eu pensei que talvez fosse mais fácil acrescentar uma volta ao toeloop. Além disso, pode-se dizer que a Adelina tinha esse objectivo. Em todos os momentos, eu sempre quis que ela se destacasse na sua patinagem – então eu mandei-a dançar quando a perna dela estava a sarar depois da lesão. A Adelina mexe-se bem e ela frequenta aulas de dança jazz desde a infância, ela sabe isso tudo. Ela tem participado nos nossos espectáculos desde criança – ela sempre esteve no palco. Todos os coreógrafos com quem ela trabalhou ficaram surpreendidos como ela aprende as coisas tão depressa – eles nunca tiveram de fazer explicações longas. Então eu sempre soube que a Adelina não se ia perder. Eu só queria que ela tivesse escolhido outro caminho e não o que ela está a fazer agora. Por outro lado, eu estou feliz por ter sido capaz de desenvolver uma atleta que, para além dos seus resultados grandiosos, é requisitada e pode se desenvolver profissionalmente. O resto é com a Adelina e quanto mais ela quererá. Esse é o seu caminho agora.

Pergunta – Não há muito tempo, eu estive a falar com um dos membros da equipa que venceu o ouro nos Jogos Olímpicos de Sochi que disse que participar em espectáculos tem dois lados. Por um lado estás a patinar e ganhar nova experiência mas o sentimento de ter dinheiro fácil muda-te. O atleta começa a perceber rapidamente que os treinos são duros e entediantes e nunca se sabe qual será o resultado. O espectáculo é fácil – patinas e és pago.

Elena Buyanova – Há espectáculos em que tu estás a prolongar o processo de treino e a desenvolver-te. Olha para os japoneses – eles patinam os seus programas com todos os saltos. Por que é que eu enviei a Sotnikova para um espectáculo de dança depois da lesão? Para que ela não ficasse parada mas trabalhasse a todo o gás. Ela recuperou mais depressa e a Adelina mudou no gelo; ela tornou-se diferente. Mesmo mais tarde eu disse-lhe muitas vezes: se tu participares num espectáculo torna os programas mais difíceis, ultrapassa-te, caso contrário vai ser muito complicado regressar. Há patinadoras boas na nossa equipa.

Nesta resposta Elena Buyanova refere-se ao facto de Adelina ter participado na versão russa do programa “Dança com as Estrelas” que tem um nível de exigência técnico muito elevado. Adelina fez um enorme sucesso nesse programa e terminou na segunda posição.

Video de uma das prestações de Adelina no programa "Dança com as Estrelas"

Pergunta: Quando é que tu achas que a Adelina atingiu o ponto de não retorno ao grande nível?

Elena Buyanova – Geralmente os atletas não entendem essas coisas. É sempre difícil retirar-se e avançar para o desconhecido – é como cair de um penhasco. Tu nunca vais conseguir fazer as coisas sozinho a menos que te empurrem. Eu vi muitos atletas que estavam prontos para retirar-se mas que não tomavam o último passo e regressavam. Não há muitos que se tenham mudado para uma nova vida assim de repente. Tu tens razão: quando há muitos espectáculos tudo descarrila. Os atletas param de ser exigentes. Eles deixam de entender que se entras na pista como campeão olímpico tens de estar a esse nível.

Pergunta: Estás a dizer que isso foi o que aconteceu com a Adelina?

Elena Buyanova – Infelizmente…

Pergunta: Quando o teu pupilo Maxim Kovtun se mudou para o grupo de Inna Goncharenko, tu contaste como era doloroso ver o teu atleta todos os dias a ser treinado por outra pessoa. Agora a situação é a inversa: tu concordaste em aceitar a Elena Radionova compreendendo que a Inna Goncharenko também ia sentir o mesmo. Por que é que fizeste isso?

Elena Buyanova – Eu não aceitei a Radionova por vingança. Ela pediu-me para se juntar à equipa e disse que estava pronta para trabalhar. Isto não foi sobre uma atleta que veio de fora. A Lena cresceu na nossa escola e, em muitas coisas, perante os meus olhos; eu sei que tipo de lutadora ela é e como ela pode patinar. Não importa os termos em que coloques a questão – é a nossa escola e são as nossas crianças.

Referência ao facto de tanto Elena Buyanova como Inna Goncharenko fazerem parte do quadro principal de treinadores do mesmo clube em Moscovo.

Pergunta:  Quando o Kovtun te deixou, eu não me lembro de teres falado na “nossa escola, as nossas crianças, não importa qual é o treinador”.

Elena Buyanova – Como líder do CSKA, eu podia ter impedido essa mudança de treinadora. Sim, foi difícil para mim. Mas se o meu atleta fez a escolha por que é que deveria impedi-lo?

Pergunta: Tu aceitaste a Radionova imediatamente?

Elena Buyanova – Não, eu pensei um pouco sobre isso. O que eu gostei foi que a Lena não estava a tentar desculpabilizar-se do que se passou na temporada anterior. O treinador não é um deus, nem sequer o mais genial. O atleta é igualmente responsável.


Elena Radionova


Pergunta: Tu nunca tiveste dúvidas que a Maria Sotskova, que estava a trabalhar contigo há cerca de um ano, ia reagir bem? Que, por assim dizer, ela podia ter levado isso a peito e ter ido procurar uma equipa mais confortável?

Elena Buyanova – Eu duvido que actualmente tenhamos atletas que possam ditar as regras quanto aos treinadores. Pelo menos eu não consigo compreender uma situação dessas. Obviamente que a Sotskova esteve um pouco desconfortável especialmente porque, depois dos Europeus, houve conversas sobre ela ser substituída pela Radionova. Isso foi falado a toda a hora. Mas eu penso que isso tornou a Maria mais forte e eu não vejo nada de errado nisso. Além de que o Javier Fernandez e o Yuzuru Hanyu treinam juntos – isso torna-os menos bons? Olha a Eteri Tutberidze: ela tem a Zagitova que cresceu na sombra da Medvedeva, que por sua vez estava a patinar na sombra da Lipnitskaya. Tu perguntaste-me sobre a Sotskova – não é certo que ela esteja desconfortável com a Radionova. A Elena não só entrou numa situação complicada mas numa das mais difíceis pois sabe que ninguém lhe dará atenção exclusiva. Se eu tiver de comparar as duas atletas, é mais difícil para a Lena porque ela praticamente perdeu um ano, ela tem de recuperar e isso dá muito trabalho. Quando o atleta ainda é uma criança e começa a vencer, é só trabalho, trabalho, trabalho. Por exemplo, o primeiro toeloop, o primeiro axel, o primeiro lutz, depois as combinações – coisas que são comuns a todos. No entanto, nós estamos num ponto em que nós podemos decorar os programas. Como uma árvore de natal.

Pergunta: Nos últimos dois anos, o mundo da patinagem artística só fala sobre a Rússia ter a Evgenia Medvedeva e que ela é imbatível. Eu penso que muitos atletas se sentem desencorajados pensando se é possível bater a Medvedeva. E os treinadores? Tu às vezes pensas que é impossível bater a Medvedeva?

Elena Buyanova – Tu sugeres que nos sentemos à espera que a Evgenia se retire? Bem, mais alguém há-de aparecer. Se um atleta tem a reputação de ser imbatível, enquanto treinadora eu sempre respeito isso. Mais do que ninguém, eu sei o quanto isso requer muito trabalho. O meu objectivo é ter a certeza que os meus patinadores competem com o líder e não que apenas partilhem o gelo na mesma competição. Eu adorei a entrevista recente do Shoma Uno onde ele diz que gosta de ser o perseguidor. É óptimo quando a pessoa não se sente apenas a chegar ao mesmo nível, mas sim a perseguir. Claro que aqueles que se tornam líderes marcam a fasquia. Mas isso não significa que não podes ultrapassá-los. O líder é aquele que quer mais, trabalha mais e ultrapassa mais. Essas pessoas tornam-se as primeiras. Quando os atletas se contentam com o que têm tornam-se medíocres.  Francamente, eu não entendo por que é que se trabalha tanto para depois ser medíocre. Eu nem sequer estou a falar de mim própria. Afinal treinar é a minha profissão e eu fiz essa escolha já adulta. Mas eu sempre tento explicar a todos aqueles que eu treino: quando tu és medíocre, tu não és ninguém. Talvez seja por isso que eu sou tão exigente – eu andei nesse caminho muitas vezes e eu sei como pode ser assustador retirar-se quando há um vazio por dentro e um sentimento de falhanço. Agora a Medvedeva tem um objectivo – garantir que ninguém a apanha. Ela tem de tornar-se melhor, ainda mais interessante. No entanto, eu sei que há pessoas que pensam “Ainda melhor? Para quê?”.

Pergunta: Quão sério é o desafio das canadianas Osmond e Dalleman?

Elena Buyanova – Eu gosto das duas: fortes, saltadoras, muito femininas e isso é uma grande vantagem. É um tipo de patinagem que eu sempre gostei: eu sempre gostei que os saltos não sejam grandes mas enormes. Então as duas podem ser perigosas nos Jogos Olímpicos. Nós não devemos subestima-las.

Pergunta: Falando nos Jogos Olímpicos: tu não vês que não importa o quanto Sotskova e Radionova trabalhem pois, no actual estado competitivo das senhoras, as duas podem ficar de fora da equipa?

Elena Buyanova – É algo para que todo o treinador tem de estar preparado. Eu só quero que os meus patinadores não percam as oportunidades que tiverem. É para isso que nós trabalhamos – não perder as oportunidades. Há um ano muitos duvidavam que a Sotskova conseguia qualificar-se para a final do circuito do grande prémio – eu vi a dúvida nos seus olhos. Mas quando nós apresentámos os planos, a própria Maria disse “Eu vou conseguir”. Quando ela começou a trabalhar eu fiquei maravilhada com a sua determinação. E imediatamente acreditei que a miúda ia conseguir. E depois aconteceram os campeonatos nacionais da Rússia e a Maria trabalhou como uma louca para se preparar.

Pergunta: E depois ela já não tinha mais energia?

Elena Buyanova – Eu diria que ela “expirou” ligeiramente depois de se ter qualificado para a equipa. Mas houve momentos específicos. No Inverno, a Maria esteve doente durante duas semanas e, claro está, o pensamento de que ela poderia ser substituída estava a pressioná-la. Apesar da sua técnica base ser muito boa, ela tem de trabalhar mais duro que outras patinadoras porque é muito alta.

Pergunta: Há alguma possibilidade da Sotnikova querer voltar a patinar e perguntar-te se pode regressar ao teu grupo?

Elena Buyanova – O que é que queres dizer com “querer patinar”? É o que ela diz. Ela está a preparar-se para os testes.

Pergunta: Apesar do facto de ela, assim que se mudou para o Plushenko, ter imediatamente rompido um ligamento?

Elena Buyanova – A lesão não tem nada a ver com isso apesar de ter sido séria. Quando o atleta revela à imprensa coisas sobre os novos programas e os planos mas não declina todos os outros eventos, é óbvio que os planos para regressar não devem ser levados a sério. Nada acontece assim no desporto.

Pergunta: Ainda estás chateada com a Adelina por ela te ter avisado da mudança para o Plushenko por sms?

Elena Buyanova – E não o escondo. Mas isso não é o ponto. Eu conheço a Adelina muito bem, se calhar ainda mais que a mãe dela. Em algumas coisas elas ainda é uma criancinha. É algo que todos os grandes atletas têm em comum: eles acreditam piamente que eles conseguiram tudo sozinhos. Eles não compreendem nem querem entender que o resultado é obtido parcialmente graças ao treinador que os puxou durante anos, que os levou aonde eles não conseguiam chegar sozinhos. Quando a Adelina e eu entrámos naquele período de falta de comunicação, ela uma vez disse-me “vais ter dificuldades comigo”. Eu respondi “E tu achas que alguma vez foi fácil contigo”. Houve uma altura em que eu pensei que não havia nada de novo para mim na patinagem artística. Que eu nunca ia ter atletas mais difíceis para trabalhar do que aqueles que eu já tinha tido. Que os próximos seriam mais fáceis. E depois aparece mais alguém e tu percebes como eles são todos diferentes. Que tu não podes aceitar alguém e simplesmente “copiar/colar” o trabalho anterior. Pelo menos eu não consigo fazer isso. Todos são diferentes; uma experiência diferente. E isso faz-te evoluir. Quando ao regresso – nós já passámos por isso e vimos o que aconteceu. Como eu disse, os limites da confiança foram quebrados. Eu não amo a Adelina menos do que antes; ela ainda é preciosa para mim como uma atleta com quem eu fiz uma longa e complicada viagem mas já não há volta a dar. Nós raramente nos vimos durante o ano passado por causa de todos esses espectáculos e treinar alguém entre espectáculos é algo que eu nunca faria. Eu não consigo acreditar que a Adelina realmente queira regressar. Eu não acho certo continuar a enganar-se a mim e a ela própria.

Pergunta: Se calhar é muito mais fácil? A Sotnikova, sabendo como tu és exigente, como tu metes a fasquia muito alto, teve medo de não conseguir estar à altura das expectativas? Tens de concordar que seria difícil regressar à equipa onde outra patinadora está a alcançar o topo de forma e onde não te sentirias igualmente boa. Ela tem alguma auto-estima.

Elena Buyanova – Eu penso que no fundo ela não conseguia partilhar-me com a Maria. Ela estava à espera que eu recusasse os outros todos por ela.

Pergunta: E?

Elena Buyanova – E que a convencesse a patinar. 

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Notícias da Rússia - A caminho da semana de testes

A semana de testes na Rússia é um dos momentos mais aguardados do início de temporada e este ano não é excepção.
Durante a semana de testes, os patinadores que fazem parte do grupo de elite e os que são os principais candidatos a um lugar na selecção nacional do país tem de apresentar-se perante os responsáveis da federação russa e de um conceituado grupo de especialistas. Os testes de 2017 irão realizar-se na cidade de Sochi. Aí, os patinadores terão a oportunidade de mostrar os programas que pensam patinar para a temporada 2017/2018. Todos os programas são sujeitos a avaliação. Consoante a avaliação, os patinadores e as suas respectivas equipas técnicas terão um prazo para realizar melhorias nos programas antes de poderem competir em competições internacionais. Na semana de testes, os patinadores também terão a hipótese de apresentar algum elemento novo em que tenham trabalhado durante a época baixa.
Entretanto já se sabe que o par Ksenia Stolbova & Fedor Klimov não irão apresentar-se na semana de testes. Fedor foi submetido a uma operação cirúrgica há cerca de um mês e ainda está em recuperação, sendo que há certos elementos que ele ainda nem sequer pode arriscar, nomeadamente o twist e as figuras de elevação. Como Ksenia e Fedor têm uma justificação médica para a falta de comparência nestes testes, é possível que sejam avaliados em privado assim que for possível. Consta que este par planeia iniciar o seu calendário competitivo no Troféu Finlândia.

Fedor Klimov está a braços com mais uma lesão complicada


Quem também ficará de fora da semana de testes é o famoso par Tatiana Volosozhar & Maxim Trankov. Tatiana e Maxim têm estado a patinar no espectáculo “Romeu e Julieta” produzido pela companhia de Ilya Averbukh e duvido que tenham tido tempo de preparar novas coreografias. Além disso, esta falta de comparência na semana de testes parece indicar uma coisa que já muitos suspeitam: Tatiana e Maxim não voltarão ao circuito competitivo.

Tatiana Volosozhar & Maxim Trankov


Adelina Sotnikova e Julia Lipnitskaya foram figuras maiores no Jogos Olímpicos de Sochi e arrebataram corações. Quem estava à espera de vê-las na semana de testes desengane-se. Julia e Adelina não irão marcar presença. No caso de Julia, tudo aponta para o final de carreira na patinagem de competição (pelo menos como individual). Adelina continua a trabalhar sob a orientação de Evgeny Plushenko mas é possível que ainda não esteja pronta para regressar.


Adelina Sotnikova


Na categoria masculina destaca-se a ausência de Artur Dmitriev Jr. pois a própria federação impediu a sua participação! Não sei qual é a justificação para este impedimento mas espero que não seja uma punição disciplinar.


Na categoria de dança aguarda-se com alguma ansiedade a confirmação da presença de Elena Ilinykh e Anton Shibnev. 

Elena Ilinykh & Anton Shibnev
(Fonte: Instagram)

domingo, 20 de agosto de 2017

Tradução de entrevista do par Tarasova & Morozov


O jovem par russo composto por Evgenia Tarasova e Vladimir Morozov tem demonstrado uma evolução sólida no circuito internacional. Na temporada 2016/2017 sagraram-se campeões da Europa e venceram a final do grande prémio. Nos mundiais seguraram a medalha de bronze apesar de terem sofrido vários percalços nomeadamente um corte na perna de Evgenia que a impediu de estar ao seu melhor nível. Nas vésperas de iniciarem a época 2017/2018, Evgenia e Vladimir concederam uma entrevista à jornalista Ekaterina Chervniavskaya. O link original pode ser consultado aqui: http://www.sport-express.ru/figure-skating/reviews/evgeniya-tarasova-i-vladimir-morozov-uprekat-partnera-za-oshibki-neprofessionalno-1297107/




Tradução de entrevista

Pergunta: Tiveram a oportunidade de celebrar a vossa liderança na lista das pontuações da ISU?

Vladimir – Os fãs e os amigos enviaram-nos os “screenshots”; claro que foi agradável mas não é nada de mais.

Pergunta: Como é que está a decorrer a preparação dos dois novos programas?

Vladimir – Nós temos dois novos programas interessantes. Nós gostamos deles e a federação também. Nós temos esperança que eles resultem. O programa curto é clássico e digamos que o programa livre é feliz e alegre. Nós ainda não vamos revelar as músicas e vamos esperar pelos testes em Setembro.

Pergunta: O coreógrafo foi o Peter Tchernyshev?

Vladimir – Sim. Este ano ele coreografou ambos os programas. Na temporada passada, nós tentámos o programa curto com ele e resultou bem portanto nós decidimos trabalhar com ele nos dois programas deste ano.

Pergunta: Os fatos estão prontos?

Evgenia – Não, nós ainda estamos a pensar e a ver os desenhos. De momento, só temos uma vaga ideia de como eles vão ser.




Pergunta: Na temporada passada vocês tiveram de mudar os fatos do programa livre.

Evgenia – Sim, a primeira versão não foi bem sucedida e disseram-nos para mudar. Nós também não gostámos muito da segunda versão mas não havia tempo ou oportunidade para fazer novos fatos.

Pergunta: Tu tens fatos favoritos?

Evgenia – O do programa curto da época passada. Eu também amei o fato preto que usei no programa tango nos juniores e o fato cor de pêssego no programa livre de juniores. Esses programas foram coreografados por Maxim Trankov.

Vladimir – Os fatos do programa irlandês do ano passado eram fixes mas, no geral, todos os fatos foram bons.

Pergunta: Vocês planeiam acrescentar mais elementos complexos esta temporada?

Vladimir – Os saltos e os saltos lançados serão os mesmos; nós estamos a trabalhar nos elementos mais fáceis como os peões.

Pergunta: Por exemplo, não vão tentar um quádruplo lançado?

Evgenia – Um quádruplo twist – sim; um lançado – não.

Pergunta: O que é que tens a dizer àqueles que afirmam que o quádruplo twist é inútil: que um triplo twist bem realizado garante mais pontos?

Evgenia – Um elemento desses diz algo sobre o nível do par. É mais complicado e custa mais. O resto depende de como nós o vamos efectuar. Nós vamos tentar o nosso melhor para fazê-lo de forma limpa.

Vladimir – Muitas vezes tudo depende da execução então, em algumas ocasiões, nós não conseguimos pontos adicionais. Mas se apenas fizermos o quádruplo twist nos treinos, irá demorar mais tempo a integrá-lo no programa.

Pergunta: Foi doloroso ouvir que o vosso programa livre era muito pior que o dos vossos adversários?

Evgenia – É apenas uma critica que temos de levar em consideração e não repetir esses erros no futuro.

Foram colocadas várias questões sobre este programa


Pergunta: Vocês não sentiram isso quando o programa estava a ser coreografado?

Evgenia – Este programa tem cá uma história! Inicialmente, nós tínhamos uma peça musical mas depois a federação viu-o e decidiu que a música era errada. Em resultado, nós tivemos de mudá-la e tudo ficou muito caótico.

Pergunta: Em que momento é que a federação avalia os programas? E há tempo suficiente para fazer mudanças depois disso?

Evgenia – Os nossos programas foram avaliados em Julho no estágio em Sochi, quando os representantes da federação foram ver-nos. Foi-nos dito que não servia. No final nós mudámos a música.

Pergunta: Quanto tempo é que leva transformar o programa da ideia inicial para algo competitivo?

Vladimir – Cerca de um mês…

Evgenia – Desta vez o coreógrafo Peter Tchernyshev levou duas semanas. Depois nós vamos trabalhar nos programas até Setembro.

Pergunta: Digam-me como é trabalhar com o Robin Szolkowy. Em que língua é que vocês comunicam?

Evgenia – Inglês.

Pergunta: Sabes inglês suficiente?

Evgenia – Bem, o meu inglês é um pouco básico, o do Vladimir é melhor. Mas o Robin e eu entendemo-nos.

Pergunta: E russo?

Evgenia – Bem, o Szolkowy sabe dizer coisas como “olá” e “bom dia”. Afinal de contas ele estudou um pouco de russo.

Pergunta: E não foi por nada visto que patinava com a Aliona Savchenko.

Vladimir – Foi mais a Aliona que aprendeu alemão.

Pergunta: Sentem-se confortáveis sendo os líderes dos pares russos?

Vladimir – Nós sempre tivemos o objectivo de sermos os primeiros mesmo quando ninguém nos levava a sério. Ser líder é confortável. Além disso, nós nunca nos sentámos a pensar que “somos os n.ºs 2-3 e que ninguém espera muito de nós e que é melhor assim”. Nós sempre quisemos lutar e sempre quisemos mais.

Pergunta: Estão preparados para competir com Stolbova & Klimov? Eles estiveram na sombra durante a temporada passada. Há alguma tensão durante os treinos?

Evgenia – Nós não treinamos ao mesmo tempo. Eu penso que tudo se tornará mais claro durante as competições.

Pergunta: Qual é o espirito no vosso grupo?

Evgenia – Nós todos temos uma relação amigável; nós sempre nos encontramos depois e as competições são o único sítio onde somos rivais. Mas é sempre interessantes seguir os rivais nos treinos e fazer comparações. Faz-te ficar em forma.

Pergunta: Na disciplina de pares há sempre lugar a erros individuais. Qual é a sensação quando tu patinaste perfeitamente mas o teu parceiro falhou num elemento?

Evgenia – Quando patinas com um parceiro e um erro acontece, a culpa é de ambos mesmo que tenha ocorrido num salto a solo. Não sentimentos de mágoa. Mas tudo depende realmente da relação entre os parceiros. Nós nunca sentimos que recebemos notas mais baixas do que as que merecemos. E nós nunca nos culpamos um ao outro.

Vladimir – Acho isso pouco profissional.

Pergunta: Vocês têm oportunidade de falar um com o outro enquanto patinam para mudar algo no programa caso seja necessário?

Vladimir – Apenas algumas pequenas coisas. Talvez para mudar um passo e juntarmo-nos. Nós não podemos mudar algo global. O programa é coreografado para o máximo das nossas possibilidades actuais. Nós apenas podemos falar sobre mudanças nos vestiários cerca de 15 minutos antes de irmos para a pista.

Pergunta: Ficaram com a sensação que o nível nos últimos mundiais foi super alto?

Vladimir – É difícil partilhar as nossas impressões desses campeonatos; por causa da lesão, o programa curto e o livre não foram realizados no seu potencial pleno e nós estávamos na nossa melhor forma! Nós patinámos bem mas houve competições onde patinámos melhor… Durante a época nós percebemos que estávamos a crescer tecnicamente e que o nosso par estava a ser recebido de maneira diferente. Como líder. A lesão arruinou essa impressão da temporada mas apesar disso nós fizemos todos os elementos e não falhámos nenhum.

Pergunta: Qual foi a competição mais enervante da época passada?

Vladimir – Os mundiais. Quando chegas lá e nem fazes ideia se vais conseguir patinar. A Evgenia levou pontos e tomou analgésicos então inicialmente ela não sentiu nada. Mas, claro está, que o efeito dos analgésicos desaparece e nós não fazíamos ideia o que iria resultar da lesão.

Pergunta: Deixou-vos um sabor amargo?

Evgenia – Tudo acabou bem.

Vladimir – Sim e não. Eu penso que nós poderíamos ter conseguido notas mais altas em ambos os programas, patinado com mais liberdade. Mas também podíamos ter desistido da competição.

Pergunta: Vocês estão contentes com as provas do grande prémio da próxima época?

Vladimir – Sim mas foi duro antes de termos as inscrições. Os patinadores chineses foram os primeiros a escolher as suas provas, depois foram os alemães e nós ficámos com o que sobrou. Este ano a ordem das provas foi alterada – anteriormente eram as provas na América do Norte, as provas europeias e depois as provas asiáticas. Agora é uma prova na América do Norte e outra na Ásia. Acho que vai ser mais difícil para os atletas se conseguirem adaptar. Nós tivemos sorte com as inscrições.

Pergunta: Vai ser difícil patinar perante o público caseiro?

Vladimir – É possível. Mas vai depender da nossa preparação. Quando estás bem preparado e todos os elementos saem de forma automática, não interessa onde estás a patinar.

Pergunta: Falem um pouco sobre a participação no WTT.

Evgenia – Foi algo de novo.

Vladimir – Foi o nosso primeiro WTT e a nossa primeira vez no Japão. O país é fora do vulgar e não há realmente uma atmosfera muito competitiva quando as férias se aproximam e os patinadores convivem alegremente. Certamente que nenhum dos patinadores estrangeiros levou aquilo a sério.

Pergunta: O que é que foi mais memorável?

Evgenia e Vladimir – A “Kiss n’ Cry” (Nota: nome dado ao local onde os patinadores esperam pelas pontuações)

Pergunta: Vocês receberam um prémio especial por causa disso.

Vladimir – Sim! No final, durante o banquete onde as equipas foram premiadas, nós recebemos o prémio para melhor espírito de equipa.

Pergunta: Vocês estavam à espera disso?

Evgenia – Foi-nos dito que todos os anos atribuem um prémio à equipa com a melhor “Kiss n’ Cry”. Este ano, desde os primeiros dias que a nossa equipa estava determinada em vencê-lo. Nós fizemos o nosso melhor para ajudar.

Pergunta: Falem-nos do clima nas festas depois da competição.

Evgenia – Primeiro há uma parte oficial com os juízes e os atletas.

Vladimir – Os representantes da ISU discursam, depois é a vez do país organizador e depois há comida, bebida e música.

Pergunta: Normalmente, quem é que se mistura com quem?

Evgenia – Normalmente é com os amigos e a equipa. Habitualmente, nós ficamos com a nossa equipa e com os italianos e os franceses que nós conhecemos dos estágios.

Vladimir – É isso mas por alguma razão misturamo-nos menos com as equipas norte-americanas.

Pergunta: Como é que foram as vossas férias?

Evgenia – Nós tivemos duas semanas de férias. Nós passámos 12 dias no Bali com amigos do nosso grupo. Foi divertido.

Pergunta: Tiveram algum momento em que disseram: “Ok, já chega, vamos voltar para o gelo”?

Evgenia – Quando nós regressámos fomos para um estágio em Kislovdosk (?) onde não havia gelo nenhum. Então chegou a sensação de “Eu quero estar no gelo e não apenas correr no estádio”.

Pergunta: Houve coisas que tiveram de fazer durante as férias para manterem a forma física?

Evgenia – Nem por isso… Só se fores idiota é que não percebes que tens de te manter em forma.

Pergunta: Em que altura é que percebeste que patinar não era só diversão mas que se podia tornar em algo maior?

Evgenia – Acho que foi quando me decidi mudar de Kazan para Moscovo. Eu percebi que não podia voltar atrás e tinha de seguir em frente.

Vladimir – Quando terminei a escola e tive de decidir se ia para a Universidade ou se continuava a patinar. Esse foi o ponto de viragem: desporto ou profissão.

Pergunta: Ponderaste ir para a Universidade?

Vladimir – Nunca é tarde para estudar.

Pergunta: Isso é possível tendo em conta os vossos horários?

Evgenia – Estudar é exigente. Por outro lado, nós chegamos dos treinos muito cansados e não queremos fazer nada. Só dormir…

Pergunta: Os vossos pais seguem a vossa patinagem?

Evgenia – Claro que sim. Eles apoiam-nos mas tentam não incomodar. Eles leem coisas na internet durante as competições. Mas quando estou ao telefone com a minha mãe, nós falamos de outras coisas.

Pergunta: O Vladimir disse numa entrevista que houve uma altura na sua carreira que a sua antiga parceira e a mãe dela habitavam na casa dele mas que ele sentiu que não ia dar certo. Afinal como é que vocês se separaram? (Pergunta relativa à parceira que Vladimir teve antes de se juntar a Evgenia)

Vladimir – Ó, deram-nos parceiros diferentes e a situação resolveu-se a si própria. Mas o próprio treinador viu que nós não formávamos uma boa parceria.

Pergunta: As separações com os vossos anteriores parceiros foram amigáveis e não há ressentimentos?

Evgenia – Anteriormente eu só patinei com o Egor Chudin e ele foi convidado para patinar em espectáculos e eu tive a possibilidade de me juntar ao Vladimir. Então não houve drama.

Vladimir – Eu não tenho quaisquer ressentimentos.

Pergunta: Vladimir, tu quando começaste jogavas hóquei. Alguma vez te arrependeste de teres optado por um desporto menos bem pago?

Vladimir – Quando se é criança a perspectiva é diferente. Eu não patinava numa escola mas sim num programa de preparação. Então não havia ambição para me tornar patinador profissional. Simplesmente tudo resultou muito bem.

Pergunta: Não é nenhum segredo que vocês formam um casal fora das pistas. Isso torna o trabalho mais fácil ou mais difícil?

Vladimir – Eu acho que é mais fácil porque eu posso dizer coisas à Evgenia que não partilharia se ela fosse apenas minha parceira no gelo. Nós podemos ser mais abertos. É como se estivesses com alguém muito próximo e, quando dizes algo da boca para fora, é levado de forma completamente diferente. Mas dizer algo da boca para fora é muito menos perigoso do que guardar as coisas cá dentro. Quanto às dificuldades, elas sempre existirão.

Pergunta: Existe algum sentimento de especial responsabilidade nos elementos perigosos em que estás numa posição de controlo?

Vladimir – Claro que sim. Para o parceiro masculino é muitas vezes mais difícil do que para a patinadora. Quando ela está no salto lançado, tu estressaste sobre se ela fará a recepção. Não é só atirá-la e relaxar. A responsabilidade e o medo são repartidos de igual modo. 

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

Tradução de entrevista de Elena Radionova


Elena Radionova conquistou os corações de muitos fãs de patinagem artística quando ainda estava no escalão júnior. Depois de uma excelente transição para os seniores, onde venceu várias medalhas, Elena ficou de fora da selecção nacional russa para os europeus e mundiais da temporada passada. Elena está determinada em volta aos maiores palcos internacionais em grande nível e quer segurar um lugar na equipa russa para os próximos Jogos Olímpicos de Inverno. Entretanto, Elena concedeu uma entrevista à conceituada jornalista Elena Vaytsekhovskaya. Podem ler a tradução em baixo e consultar o link original aqui: http://www.sport-express.ru/se-velena/reviews/elena-radionova-menya-osuzhdayut-za-smenu-trenera-ya-gotova-k-etomu-1294133/




Tradução de entrevista

Pergunta: Como é que é ter subido tão alto em 2015 para depois seres descartada um ano depois?

Elena – Quase todos os patinadores passam por fases más. Então eu não fui descartada. Acho que foi uma hipótese para pensar e reconsiderar algumas coisas. Para perceber o que eu fiz de errado.

Pergunta: Tu habituaste toda a gente a seres capaz de competir; tu estavas sempre por cima das situações mesmo se tivesses patinado no limite. O que é que mudou? Quando é que apareceu a sensação de que as coisas estavam a correr mal?

Elena – Acho que desde o início da temporada. Eu tive lesões, depois fiquei doente e cheguei aos testes* sem estar preparada. Eu tentei ficar em forma durante a época mas não consegui. Eu compreendi que não tive a preparação que necessitava e estava a faltar o contacto habitual com a treinadora. Cada uma destas coisas em separado não foi nada de mais mas tudo junto levou a isso.

*referência à semana de testes na Rússia em que os patinadores apresentam os seus programas e elementos novos aos responsáveis da federação.

Pergunta: O Sergei Voronov e posteriormente o Maxim Kovtun juntaram-se ao grupo e a tua treinadora teve de dividir a atenção dela – quanto é que isso influenciou?

Elena – Eu tive excelentes treinos com o Maxim e o Sergei. Eu estive sempre focada em mim mesma então os rapazes apenas me motivavam.

Pergunta: Os parceiros de treino têm outro lado; durante muitos anos tu foste a única patinadora da tua treinadora e de repente passaste a ser apenas mais uma atleta, provavelmente nem sequer a principal atleta. Penso que isso não foi agradável de perceber?

Elena – Nessa altura eu recebi muita ajuda da Tatiana Tarasova. Então eu não me senti excluída.

Pergunta: Ela aconselhou-te a mudar de treinadora?

Elena – Não. A ideia foi minha.

Pergunta: Durante os campeonatos nacionais russos em Dezembro, passou-te pela cabeça que não conseguirias chegar à selecção?

Elena – Eu nem sequer estava a pensar na classificação; Eu apenas pensei em patinar ambos os meus programas de forma limpa. Mentalmente eu estava preparada. No geral eu apenas cometi um erro – um toque no gelo na recepção no triplo loop. Não foi uma falha terrível mas fiquei em quinto lugar. Talvez outra pessoa ficasse muito chateada. Eu convenci-me que eu apenas tinha de continuar. Sim, eu perdi. Acontece. É desporto.

Pergunta: Foi difícil não desistir sabendo que irias aos europeus nem aos mundiais?

Elena – Claro. Todos queremos vencer e cada derrota é dura. Eu obriguei-me a pensar nos Jogos Universitários; que eu tinha de patinar bem aí para ter uma hipótese de participar no WTT (World Team Trophy). Eu ganhei essa hipótese. Então eu não posso dizer que perdi os campeonatos nacionais e que a época acabou. Foi o oposto – aquela derrota fez-me ficar mais concentrada. Essa foram as coisas positivas dessa situação. No tempo que eu tive, eu pude analisar o que aconteceu e o que eu precisava fazer para melhorar e trabalhar nos erros que eu cometi.

Pergunta: Esses erros foram culpa tua? Ou foram as circunstâncias?

Elena – Claro que foram culpa minha.

Pergunta: O quê?

Elena – Não estou disposta a falar sobre isso agora. É suficiente que saiba as razões e que trabalhe nelas.

Pergunta: A (Shae-Lynn) Bourne coreografou o teu programa curto da temporada passada e depois toda a gente começou a dizer que ela 100% a tua coreógrafa. Esta é a razão pela qual foste trabalhar com ela outra vez?

Elena – Eu amei o programa e como foi recebido então eu decidi que na temporada seguinte eu iria trabalhar com a Shae-Lynn em pelo menos mais um programa.

Pergunta: Não estavas a planear manter esse programa curto por mais uma temporada?

Elena – Não é que eu estivesse a planear isso mas realmente gostaria de mantê-lo. Quando eu comecei a trabalhar com a Buyanova, de repente, ela disse que adoraria manter o programa por mais uma época, então nós chegámos a um acordo. Daí surgiu a ideia que a Shae-Lynn também coreografasse o programa livre. Eu adoro o estilo dela e nós temos um bom entendimento quando trabalhamos no gelo.

Pergunta: O que é que gostas mais quando trabalhas com a (Shae-Lynn) Bourne?

Elena – A Shae-Lynn tem o seu próprio estilo de patinagem que é muito da América do Norte. É diferente do nosso. Existem muitos pequenos detalhes que tu tens de efectuar com as pernas e os canadianos certificam-se sempre que cada movimento seja integrado na música.

Pergunta: É difícil?

Elena – Podes ter a certeza. O programa começa a brilhar quando acertas mesmo nos acentos da música. Para isso é preciso ouvir a música, sentir o tempo e tudo entra em piloto automático. Outra coisa que eu adoro no trabalho da Shae-Lynn é que todos os programas dela são muito diferentes. Ela consegue sempre trazer alguma coisa nova. Se seguires o trabalho de alguns coreógrafos, tu podes encontrar os mesmos passos e figuras que são repetidos noutros programas. A Shae-Lynn tem trazido coisas novas. Coisas diferentes dos outros.

Pergunta: A Tarasova disse uma vez que não faz mal manter o mesmo plano de elementos nos programas; quase todos os patinadores fazem isso.

Elena – Isso não é interessante. Olha para a Ashley Wagner – os programas dela são tão diferentes e, além disso, eu penso que a patinagem artística tem sobretudo a ver com o deslizar e expressar emoções. Claro que os saltos são importantes mas o público vem primeiramente ver-nos a patinar.

Pergunta: Tu mudaste de treinadora e de sistema. O que é que sentes sobre isso?

Elena – Francamente às vezes é difícil. O horário não é assim tão diferente mas há muito mais trabalho no deslizar e nos programas. Eu aprendo a patinar focada em cada movimento. Já não há apenas a passagem de um salto para o outro.

Pergunta: Era o que acontecia anteriormente?

Elena – Era como se eu estivesse mais focada apenas nos saltos. Agora as entradas exigem mais tempo e esforço do que o salto. É muito trabalho em cada movimento, em cada passo.

Pergunta: Provavelmente seria mais fácil se ainda não tivesses títulos.

Elena – O que é que queres dizer com isso?

Pergunta: Que alguém com experiência e com títulos tem mais dificuldade em admitir que não sabe alguma coisa ou demonstrar que não consegue fazer alguma coisa…

Elena – Pelo contrário. Eu vim aqui para aprender então eu escuto cada palavra. Há muitos especialistas que trabalham comigo e eu aprendo com cada um deles. É óptimo!

Pergunta: Os teus parentes tentaram fazer-te mudar de ideias quanto à mudança de treinadora?

Elena – Não.

Pergunta: Seguramente que discutiste o assunto com alguém.

Elena – Os meus pais sabiam que eu tinha essa ideia em mente. Eu e a minha mãe somos muito próximas; ela sempre teve uma grande presença na minha vida e ela sabia dos meus problemas e hesitações. Então, quando eu disse em casa que tinha tomado uma decisão, os meus parentes aceitaram-na. Isto ainda é um assunto difícil. Eu sou grata à Nina Germanovna por tudo o que ela fez por mim mas às vezes chega-se a um ponto sem retorno. Já não há o entendimento que costumava existir, algo já não funciona, o trabalho já não é satisfatório, já não há alegria e tudo o que parecia tão certo na tua vida se desvanece. Eu percebi o quanto eu devo à minha treinadora, o tempo que ela investiu em mim com o seu conhecimento, o seu amor e a sua alma. Mas o sentimento de ponto sem retorno prevaleceu.

Pergunta: Ficaste preocupada com o que iria ser dito sobre a mudança?

Elena – Na patinagem artística percebes muito cedo que existem pessoas que simplesmente gostam de ti e outras pessoas a quem tu irritas. Claro que eu sabia que as pessoas me iam julgar e estava preparada. Afinal de contas todos temos direito a ter uma opinião.

Pergunta: Tu já te tinhas ajustado com treinares apenas junto de patinadores homens. Quão confortável é que estás com a garota? A Maria Sotskova treina contigo na mesma pista.

Elena – Nós raramente passamos tempo juntas no gelo. Até agora tem corrido tudo bem.

Pergunta: A Maria irrita-te?

Elena – Não de todo. Eu simplesmente não tenho tempo para olhar à volta. Tenho tanta informação para digerir. Como se eu agora precisasse de lutar pela atenção da treinadora… Eu tenho um plano sobre o que necessito fazer e isso é o mais importante.

Pergunta: Estás a planear tornar os programas mais complexos?

Elena – Vamos apenas dizer que tenho coisas a discutir com a treinadora. Para já estamos a tratar de pequenas correcções. O grau de dificuldade actual é suficiente para mim.

Pergunta: As palavras “temporada olímpica” têm um significado especial para ti?

Elena – Francamente não. Eu não quero pensar sobre isso com muita antecedência. Eu tenho de trabalhar. Depois logo se vê.

Pergunta: Se tivesses a possibilidade de escolher as tuas provas do circuito do Grande Prémio, quais é que escolherias?

Elena – Russia e China – precisamente os que eu recebi. Eu patinei o grande prémio da China nas duas últimas temporadas e sou amada lá; É o país onde eu venci a minha primeira medalha num mundial e adoro patinar lá. E casa é casa. Eu adoro patinar para o público russo. O timing também é excelente: a Taça Rostelecom (Rússia) é a primeira e a Taça da China é a terceira, e, se tudo correr bem, eu terei tempo suficiente para me preparar para as próximas competições.

Pergunta: Quando olhei para as inscrições e vi que na primeira prova ias competir com a campeã mundial Evgenia Medvedeva, eu recordei-me de 2015 quando competiste com a Tuktamysheva. Tu não cometeste erros na final do Grande Prémio e nos Europeus mas nessas duas vezes ficaste atrás dela, nos Europeus por uma margem de apenas 0.86. Como é que te sentiste nessa altura?

Elena – Claro que eu fiquei muito chateada. Mas eu era uma criança que queria mesmo ganhar só que perdi. Agora eu vejo as coisas de maneira diferente. Foi a minha primeira temporada sénior, primeiros europeus e mundiais, e eu penso que estive bem para uma estreante. Sim, podia ter vencido os Europeus e ficado com o título mas do que é que vale estar a falar nisso agora? Se calhar as coisas tinham de acontecer assim.

Pergunta: Alguma vez te cansas da patinagem artística?

Elena – Não. Eu amo patinar, é a minha vida e como é que te podes cansar da vida? Além disso eu tenho outras coisas. Como por exemplo os estudos. Eu sou estudante externa.

Pergunta: É muito exigente e requer auto-disciplina.

Elena – Não tenho problemas com isso. Quando sei o que tenho de fazer, faço-o. Na escola era a mesma coisa. Eu estudava entre os treinos, tinha professores privados à noite e trabalhava nas matérias escolares e em inglês. Foi difícil mas fiz os meus exames sem problemas. Eu sei que sou eu que preciso disto.

Pergunta: Quando trabalhas com a Shae-Lynn, vocês falam em inglês?

Elena – Sim. Inicialmente, eu estava tensa mas depois fiquei mais confortável e comecei a falar. Eu percebi que tinha de praticar independentemente do que fizesse. Depois as coisas vão provavelmente funcionar.